quinta-feira, 31 de maio de 2012

A CONCEPÇÃO ROMANA DO 'FETO'

O FETO, ser humano vivo a partir do terceiro mês de concepção até o momento do nascimento, era tido pelos juristas romanos apenas como parte das vísceras da mulher. O Digesto, código de leis mandado compilar pelo imperador Justiniano, em 530 d.C., traz:

"Partus enim antequam edatur, mulieris portio est uel uiscerum" = "O feto antes de ser dado à luz é porção da mulher ou de suas vísceras". (XXV, 4,1,1)

Devido a essa doutrina do feto-porção da mulher, não podia, em consequência, ser considerado ser humano. O mesmo código diz:

"Partus nondum editus homo non recte fuisse dicitur" = "O feto que ainda não foi dado à luz não se diz que seja homem" (XXXV, 2,9,1).

Decorre destas teses jurídicas romanas que o nascimento não se dava quando o feto era expulso do ventre materno, mas somente e necessarimente após a ruptura do cordão umbilical. Até a ruptura, não haveria a total separação dos dois organismos, o da mãe e o do filho.

Paulo Barbosa

O CONCEITO DE 'IUS' E 'FAS'

IVS E FAS são dois vocábulos latinos que significam DIREITO, mas com acepções radicamente opostas: Ius é o direito profano, enquanto Fas é o direito divino ou sagrado.

O fas tem seu campo de atuação, principalmente, no direito público, como, por exemplo, são as leges sacratae que tornam os tribunos da plebe invioláveis. No direito privado, a sua influência se dá apenas nas relações jurídicas de família, e isso em virtude da importância da religião doméstica. Gradativamente, porém, o ius foi se impondo ao fas, de maneira que, no direito romano clássico, é bem diminuída a importância deste. 

No período romano histórico, então, como vimos, ius e fas possuem acepções diversas. Agora, nos primórdios de Roma, diferiria tais conceitos? Para responder a esta questão, há duas correntes opostas de romanistas:

A primeira, representada, entre outros, por Beseler, Wenger e Huvelin, afirma que ius e fas, nas origens do direito romano, eram conceituados de maneira diferente, como a própria etimologia dos vocábulos demonstra: ius deriva-se do mesmo radical de iugum e iungere, vocábulos estes que exprimem um vínculo estabelecido pela vontade humana e estranho à vontade dos deuses.

A segunda corrente, que hoje é a dominante, é de parecer que, nos primórdios, apenas haviam princípios e regras religiosas, e somente com o passar dos tempos é que surgirá a distinção entre o ius, direito profano, e o fas, direito sagrado. A maneira, entretanto, como se deu tal distinção, é explicada de diverso modo: para Guarino, por exemplo, a vontade divina, primitivamente, não se manifestava pelo fas - por aquilo que é lícito, pela religião, praticar -, mas pelo nefas - por aquilo que não é lícito fazer. Mais tarde, os romanos chegaram à conclusão que tudo aquilo que não fosse nefas, proibido fazer, seria fas, permitido fazer. O fas, então, seria a manifestação da vontade humana delimitada pelo nefas, que, este sim, era a exteriorização da vontade dos deuses. E mais, é da evolução do conceito de fas que vai, mais tarde, surgir o ius, quando, então, fas passa a ter a significação de direito sagrado, e ius, direito profano.

Enfim, fas é um substantivo neutro latino indeclinável e os antigos romanos o relacionavam com o verbo fari = falar. Este verbo indica as palavras de um oráculo ou a linguagem dos deuses.

Paulo Barbosa

A REPÚBLICA ROMANA

A REPÚBLICA

Segundo a História, a Realeza romana teve fim abrupto, com uma revolução que expulsou Tarquínio o Soberbo de Roma, no século VI a.C., mais precisamente no ano 510, instaurando-se, então o regime republicano ou a República Romana. Nesta, dois magistrados eleitos anualmente sucederam ao rei. Tais magistrados eram denominados, a princípio, em tempo de paz, iudices (juízes), e em tempo de guerra, praetores (aqueles que vão à frente, do verbo praeeo = ir adiante, caminhar adiante). Com excessão das funções religiosas que eram do rex sacrorum e do pontifex maximus, esses magistrados - iudices, praetores - detinham o imperium real, ou seja, o poder supremo.

Há autores, entretanto, que defendem não ter sido a passagem da Realeza para a República de um jato, mediante uma revolução, mas que obedeceu a um processo lento, demorado, desenrolado entre 510 e 367 a.C. Uma das hipóteses que abona esta teoria é aquela de que, de início, ocorreu a substituição do rei por um ditador anual, auxiliado pelo magister equitum (comandante da cavalaria), o quais, mais tarde, se transformaram em praetor maximus e praetor minor, sendo o primeiro superior a este. Por fim, surgiram os cônsules, com poderes iguais.

O CONSULADO

Como se processou o desdobramento da magistratura consular? No início, dois cônsules eram os únicos magistrados com atribuições militares, judiciárias e administrativas, o que quer dizer que comandavam o exército, velavam pela segurança pública, procediam ao recenseamento da população, tomavam medidas variadas com vistas ao bem público, geriam o tesouro público, administravam a justiça criminal e exerciam a jurisdição voluntária e contenciosa.

Pouco a pouco, entretanto, vão surgindo outras magistraturas com atribuições extraídas do consulado. Tal desdobramento decorreu não somente das autoridades do Estado Romano, como também da luta da plebe para obter o ingresso na magistratura, o que, inicialmente, era prerrogativa do patriciado.

A QUESTURA

Em 509 a.C., devido a uma lei Valeria, a gestão das finanças públicas passou a ser da competência de dois questores, número que, na época de César, atingiu 40. Estes eram nomeados pelos cônsules e, pouco após a  elaboração da Lei das XII Tábuas, começaram a ser eleitos pelo povo.


DUUMVIRATO E QUESTURA DE PARRICÍDIO

No mesmo ano de 509 a.C., as questões relativas a atentandos contra a República e ao assassinato de cidadãos romanos, foram atribuídas a dois agentes subalternos, os duouiri perduellionis e os quaestores parricidii, também ambos designados pelos cônsules.

O termo latino 'perduellio' significa 'atentado contra o Estado; crime de lesa-majestade'. É composto do prefixo per, através + duellum, guerra.

A DITADURA

Algum tempo depois, em 510 a.C., foi criada a ditadura, magistratura pela qual era possível ao patriciado, por deliberação do Senado, restabelecer, em Roma, pelo prazo máximo de seis meses, o poder absoluto. Seis meses eram o tempo máximo de duração, em cada ano, das guerras na Antiguidade.

A REVOLTA DA PLEBE: O TRIBUNATO E A EDILIDADE. 

A LEI DAS XII TÁBUAS. O TRIBUNATO CONSULAR.

OS CENSORES.

A plebe, entretanto, não tinha acesso à magistratura alguma, e revoltada com o arbítrio dos magistrados patrícios, sai de Roma, em 494 a.C., dirigindo-se ao monte Sagrado, com a finalidade de ali fundar uma nova cidade. Os patrícios, ao tomarem conhecimento de tal atitude, resolveram conceder alguns benefícios, e a plebe retorna após obeter a criação de duas magistraturas a seu favor: o tribunato, composto de dois tribunos a princípio e quatro, cinco e dez, mais tarde, e a edilidade da plebe, composta de dois edis plebeus que executavam as ordens dos tribunos e custodiavam o templo de Céres, onde estavam encerrados os arquivos da plebe. Desta maneira, os plebeus possuíram garantias contra a arbitrariedade dos magistrados patrícios, pois os tribunos, cuja inviolabilidade pessoal lhes era conferida por lei sagrada, podiam vetar qualquer ato dos magistrados patrícios, embora tal veto pudesse ser neutralizado pela ação de outro tribuno mais amigo ou dócil ao patriciado.

Em seguida, a plebe começou uma luta para a obtenção de leis escitas, o que extinguiria a incerteza do direito e daria mais segurança aos plebeus. O resultado desse movimento foi a Lei das XII Tábuas, elaborada entre 450 e 449 a.C.

A partir de 445 a.C., a plebe intensificou os esforços para obter acesso ao consulado. Os patrícios, todavia, para continuar possuindo a prerrogativa do consulado, criaram o tribunato consular, constituído de vários tribunos consulares e que existiu, de maneira intermitente, de 444 a 367 a.C.

Em 443 a.C., surgiram os censores, em número de dois, que tinham a atribuição de recensear a população, de distribuí-la pelas tribos territoriais e de avaliar a riqueza dos patres familias, dispondo, ainda, de competência em matéria financeira.

Quase cem anos depois, em 367 a.C., a plebe atinge um de seus maiores anseios: a Lei Licinia de magistratibus concede ao plebeu o direito de ser cônsul. Os patrícios, porém, em vista do acúmulo de atribuições que ainda possuíam os cônsules ou para enfraquecer o consulado a ser compartilhado com a plebe, provocaram a criação de mais duas magistraturas de acesso a eles reservado: a pretura e a edilidade curul. De início, apenas um pretor havia, encarregado da administração da justiça. Mais tarde, em 241 a.C., surgiu o pretor peregino, e o primeiro passou, então, a ser denominado, pretor urbano. O pretor pregrino possuía a atribuição de dirimir os conflitos de interesses entre romanos e forasteiros, ou apenas entre estes. Os edis curuis, por sua vez, em número de dois eram encarregados da polícia dos mercados e das ações penais correlatas, bem como da jurisdição civil contenciosa nas questões ocorridas nos mercados.

A plebe, entretanto, mesmo após ascender ao consulado, continuou em movimento para conseguir a total equiparação política com os patrícios. E de tempos em tempos foi obtendo acesso às demais magistraturas: em 364 a.C., conseguiu a edilidade curul; em 356 a.C., a ditadura; em 351 a.C., a censura; e, finalmente, em 337 a.C., a pretura.

O mesmo ocorreu no concernente às dignidades sacerdotais. Em 300 a.C., a Lei Ogulnia deu aos plebeus direito de ingressar nos colégios dos Pontífices e dos Áugures. Somente algumas dignidades sacerdotais sem importância política pemaneceram inacessíveis aos plebeus.

Desta maneira, a luta de ambas as classes, patrícios e plebeus, arrastara-se por séculos, terminando no terceiro século antes de Cristo, com a vitória da plebe, que conseguiu ser admitida a todas as magistraturas patrícias e em quase todas as funções sacerdotais, ao passo que o patriciado nunca obteve ingresso nas magistraturas plebeias, o tribunato e a edilidade da plebe.

Quando a igualdade política entre as duas classes adveio, a distinção social despareceu entre ambas, surgindo, então, uma nova aristocracia, a nobilitas, a que pertenciam todas as famílias que contavam, entre seus antepassados, com um ou mais membros que ocuparam a magistratura curul, ou seja, que tenha sido ditador, cônsul, pretor, censor ou edil curul.

Paulo Barbosa

QUEM ERAM OS LATINOS?

Localização de LácioLazio no mapa da ItáliaOS 'LATINI', ou LATINOS eram, em geral, os cidadãos que viviam nas cidades situadas na região do LATIUM, localizada no centro da Itália, com 17.203 km² e cuja capital era Roma. Os habitantes das colônias latinas fundadas na Itália também eram latinos, e por isso mesmo estes se dividiam em:

1. Latini prisci, velhos latinos - que pertenciam a cidades ou colônias fundadas antes de 268 a.C.;

2. Latini coloniarii, latinos coloniários - que pertenciam a colônias latinas fundadas após 268 a.C.

Os latinos, pelas suas origens semelhantes às dos romanos, sempre foram, em face do direito, os mais favorecidos dos povos estrangeiros. Mas ao que parece, os latini prisci possuíam capacidade jurídica mais ampla do que a dos latini coloniarii. Ambos, todavia, dispunham do ius sufragii, do ius comercii, do ius actionis e da testamenti factio. Entretanto, somente os latini prisci tinham o ius conubii.

Certas leis romanas, por outro lado, concediam a pessoas que não pertenciam à cidade do Latium, nem eram membros de alguma colônia latina, condição jurídica semelhante à dos latini coloniarii. Desta maneira, os libertos que enquadravam-se em alguma das hipóteses a que aludia a Lei Iunia Norbana, eram denominados latini Iuniani. Os alforriados pelas disposições da Lei Aelia Sentia, eram os latini Aeliani.

Paulo Barbosa

UM POUCO SOBRE A REALEZA ROMANA

Rômulo, 1º rei de Roma
ROMA possuiu sete reis, narra-nos a história: Rômulo; Numa Pompílio; Tulo Hostílio; Anco Márcio; Tarquínio Prisco; Sérvio Túlio e Tarquínio o Soberbo. Apesar da existência da Realeza romana não poder ser contestada, alguns destes reis são tidos por personagens não históricas.

Conforme dito, a existência da Realeza romana é atestada de vários modos, dentre os quais podem ser citados o se ter encontrado na época da República as figuras do rex sacrorum, indivíduo que ocupava a posição mais elevada entre os sacerdotes e do interrex, senador que, designado pelo Senado, governava durante a vacância do cargo real pelo prazo de cinco dias, findo os quais, passava o poder, nas mesmas condições, a outro senador, e assim por diante até que fosse eleito o novo rei. Ora, tais figuras só se explicam com a preexistência do período real. Outra comprovação advém do misterioso rito do regifugium, sacrifício expiatório celebrado a 24 de fevereiro e o registro no calendário, nos fins da República, dos dias em que era lícito ao rei convocar os comícios - quando rex comitiauit fas.

A constituição política de Roma no período da Realeza resume-se em três termos: o rei, o Senado e os comícios.

O REI era o magistrado único, vitalício e irresponsável, isto é, que não respondia pelos seus atos perante um tribunal ou outro magistrado. A sucessão não era regida pelo princípio da hereditariedade ou mediante eleição, mas, segundo afirmam os estudiosos, o sucessor, quando não era indicado pelo antecessor, era eleito pelo interrex.

Como chefe de Estado, tinha o rei o comando supremo do exército, o poder de polícia, as funções de juíz e de sacerdote, acrescentando ainda a isso amplos poderes administativos. Era ele também que declarava guerra e celebrava tratados de paz.

Possuía o rei vários auxiliares, dentre os quais destacavam-se nas funções políticas os tribunos da cavalaria (tribunus celerum); os tribunos da infantaria (tribunus militum); o encarregado da guarda da cidade, quando o rei se ausentava (praefectus urbis). Nas funções judiciárias, os juízes criminais e de traição ao Estado (duouiri perduellionis); os juízes de assassinatos voluntários de um chefe de família, o pater (quaestores parricidii). Nas funções religiosas, os membros do colégio dos pontífices, dos áugures e dos feciais.



Senado Romano
O SENADO era o conselho do rei, sendo seus membros denominados senatores ou patres. A princípio era composto de 100 e, posteriormente, subiu a 300. A escolha dos senatores era feita, possivelmente pelo rei entre os chefes das diferentes gentes, ou seja, nos agrupamentos de várias famílias.

Convocado pelo rei, estava o Senado, portanto, em posição de subordinação diante dele. A competência senatorial era:

a) Consultiva, com relação ao rei, pois este, nos casos mais importantes, devia consultá-lo, embora não estivesse obrigado a seguir o conselho;

b) Confirmatória, com relação aos comícios, pois toda deliberação dos magistrados dos comícios, para ter validade, devia ser confirmada pelo Senado, ou seja, obter a patrum auctoritas, o parecer dos senadores.


Comitium, praça onde se realizava os 'Comitia'
OS 'COMITIA' eram assembléias convocadas pelo rei, pelo interrex ou pelo tribunus celerum. Geralmente as reuniões se davam ao pé do Capitólio, numa praça circular. Até hoje, porém, não se sabe ao certo como a vontade do povo era apurada. Nestas reuniões aprovavam-se ou rejeitavam-se a proposta de quem lhes presidia, e dentre as propostas apresentadas, citemos a de alteração do quadro das famílias; da derrogação da ordem legal da sucessão, isto é, do testamento chamado calatis comitiis; da dispensa da pena em favor do condenado, a prouocatio ad populum, e da declaração de guerra ou rompimento de tratado.

Quando as questões a serem dirimidas eram religiosas, o povo não era ouvido, mas apenas convocado para tomar conhecimento de assuntos que lhe interessavam. A tais reuniões se denominava comitia colata.

Paulo Barbosa

terça-feira, 29 de maio de 2012

HISTÓRIA DO 'ADDICTUS'

ADICTO, adjetivo e substantivo que hoje significa "aquele que se dedica habitual e obsessivamente a uma prática, geralmente má; viciado; aquele que se tornou fisiologicamente dependente de uma ou mais substâncias entorpecentes, como álcool, drogas em geral, não hesitando mesmo em cometer pequenos crimes para alimentar o vício". No passado, mais precisamente em Roma, tinha, porém, uma acepção bem diversa. Vejamos sua história:

O ADDICTUS, em Roma, era o devedor confesso de sua dívida ou o condenado ao seu pagamento, mas que, no prazo legal estabelecido (30 dias), não conseguira solvê-la. Por causa da insolvência, havia um processo de execução - a manus iniectio - mediante o qual o devedor era adjudicado - daí o nome addictus - pelo magistrado ao credor. Este o conduzia para casa, onde ficava preso durante sessenta dias, período em que devia ser levado a três feiras consecutivas para verificar se, ali, aparece algum parente ou amigo dele, devedor, para lhe pagar a dívida. Ao terminar o prazo de sessenta dias, caso ninguém pagasse a dívida ou o mesmo devedor não a soldasse, o credor podia matá-lo ou vendê-lo com escravo no estrangeiro.

Addictus é o particípio passado do verbo latino addicere = entregar, outorgar. Literalmente é 'aquele que foi outorgado, entregue a outrem'.

Paulo Barbosa

quinta-feira, 24 de maio de 2012

VERBOS EM -IO DA TERCEIRA CONJUGAÇÃO

À CONJUGAÇÃO CONSONANTAL, ou seja, à terceira conjugação cujo tema verbal é sempre uma consoante, pertencem 16 verbos amplificados no tema do presente com um i intercalado entre o tema e a desinência pessoal: são os famosos verbos em -io, semelhentes aos verbos da quarta. São eles:

1. Capio, capis, cepi, captum = apanhar, prender, entender - e seus compostos: accipio = receber; decipio = enganar; incipio = começar; intercipio = supreender; occipio = começar; percipio = compreender; praecipio = mandar; suscipio = empreender.


2. Cupio, cupis, cupivi, cupitum = desejar ardentemente - e seus compostos: concupio = desejar ardentemente; discupio e percupio = desejar ardentemente.


3. Facio, facis, feci, factum = fazer - e seus compostos: a) preposicionados: afficio = afetar, tocar; conficio = completar, terminar; deficio = abandonar; efficio = fazer, executar; inficio = tingir, dar cor a; interficio = matar; officio = impedir, prejudicar; perficio = completar; proficio = fazer progredir; sufficio = bastar, substituir. - b) com a partícula re: reficio = refazer. - c) com um advérbio ou com uma forma verbal: satisfacio = satisfazer; arefacio = fazer secar, etc.


4. Fodio, fodis, fodi, fossum = cavar - e seus compostos: affodio = cavar junto; confodio = traspassar; defodio = escavar, enterrar; effodio = desenterrar; infodio = escavar, sepultar; suffodio = cavar debaixo.


5. Fugio, fugis, fugi, (fugitum) = fugir - e seus compostos: aufugio = retirar-se; confugio = refugiar-se; defugio = esquivar-se, recusar; diffugio = fugir para aqui e para ali; effugio = escapar; perfugio = refugiar-se; suffugio= fugir para debaixo de qualquer coisa.


6. Iacio, iacis, ieci, iactum = lançar, arremeçar - e seus compostos: abicio = deitar fora; adicio = ajuntar; circumicio = lançar em roda; deicio = deitar no chão; conicio = atirar ao mesmo tempo; eicio = expulsar; inicio = deitar para dentro; interiacio e intericio = por no meio, entrepor; obicio = colocar diante; praeiacio e praeicio = deitar para diante; proicio = deitar para diante, para fora, para longe; reicio = rejeitar; subicio = sujeitar; superadicio = acrescentar; superiacio e superincio = lançar sobre; traicio = arremeçar, lançar para diante, etc.


7. Lacio, lacis [é verbo antiquado] = atrair, enganar - e seus compostos: allicio = atrair, convidar; illicio = induzir, atrair com lisonjas; elicio = fazer sair, levar para fora; pellicio ou perlicio = atrair por meio de ardil, enganar com lisonjas.


8. Pario, paris, peperi, partum = dar à luz, produzir, alcançar.


9. Quatio, quatis, [sem perfeito], quassum = sacudir, agitar - e seus compostos: concutio = sacudir ao mesmo tempor; decutio = deitar para o chão sacudindo; discutio = sacudir de todos os lados, dissipar; excutio = sacudir; incutio = infundir, incutir; percutio = espancar; praecutio = sacudir, agitar diante; recutio = espancar; repercutio = repercutir; succutio = agitar, sacudir.


10. Rapio, rapis, rapui, raptum = roubar - e seus compostos: abripio =  arrebatar; arripio = arrebatar; corripio = agarrar bruscamente, acusar, repreender; deripio = puxar para baixo, arrancar; diripio = despedaçar; eripio = tirar com violência; praeripio = arrebatar primeiro, tomar à força; surripio = tirar às escondidas, furtar.


11. Sapio, sapis, [sapi (v) i, sapui] = ter gosto por, ter bom paladar, compreender - e seus compostos: desipio = tornar insípido; resipio = ter o sabor de.


12. Specio, specis, spexi, spectum [é verbo antiquado] = ver, olhar - e seus compostos: adspicio = reparar; conspicio = olhar; despicio = olhar de cima para baixo, desprezar; dispicio = ver bem, ver em volta de si; inspicio = observar; introspicio = olhar para dentro, considerar; perspicio = penetrar com os olhos, mirar atentamente, considerar; prospicio = olhar para diante, ver longe, prever; respicio = olhar para trás; suspicio = olhar debaixo para cima, suspeitar.


13. Gradior, graderis, gressus sum, gradi [depoente] = caminhar - e seus compostos: aggredior = assaltar; antegredior = preceder, ir adiante; congredior = caminhar com, encontrar-se com, discutir; degredior = descer; digredior = afastar-se; ingredior = entrar; praegredior = preceder; praetergredior = ultrapassar; progredior = adiantar-se; regredior = voltar atrás; suggredior = aproximar-se ocultamente; supergredior = superar.


14. Morior, moreris, mori, mortuus sum [depoente] = morrer - e seus compostos: commorior = morrer com; demorior = deixar uma sociedade, uma família; emorior = acabar de morrer; intermorior = morrer lentamente, ser esquecido; immorior e inemorior = morrer em ou sobre, acabar, expirar; praemorior = morrer antes.


15. Orior, orieris, oriri, ortus sum [depoente] = surgir - e seus compostos: coorior, exorior, oborior = levantar-se, surgir; suborior = sobrevir. -  O verbo orior tem o infinitivo da 4ª conjugação; por isso, é preferível no imperfeito do subjuntivo a forma orirer, da 4ª, do que orerer, da 3ª. O particípio futuro é oriturus e o gerundivo oriundus. Note-se, ainda, que o composto adorior = assaltar, segue a 4ª conjugação: adorior, adoriris, adoriri, adortus sum.


16. Patior, pateris, pati, passus sum [depoente] = sofrer - e seu composto: perpetior = suportar.


Paulo Barbosa

ECTILIPSE

ECTILIPSE é a liberdade métrica que consiste na supressão do m final da palavra e da vogal que o antecede, quando a palavra seguinte começa por vogal. Assim:

Taurum ingentem pode, pelo poeta, ser grafado:



Taur' ingentem




Com es, est, pode suprimir-se o e depois de vogal ou depois de vogal com m:


Multa est, pode ficar Multa'st


Multum est, pode ficar Multum'st



Paulo Barbosa

INFINITIVO NARRATIVO

INFINITIVO NARRATIVO em latim é aquele empregado em lugar de um tempo passado, levando o verbo da subordinada para o imperfeito:

Ille me monere ut caverem = Avisava-me que tivesse cuidado.


Paulo Barbosa

terça-feira, 22 de maio de 2012

ORAÇÕES SUBORDINADAS SEM CONJUNÇÃO

Houve um período na história da língua em que a subordinação das orações não era ainda expressa por meio das conjunções. Em latim ainda há vestígios deste tipo de construção, usando-se o conjuntivo sem conjunção:

1. Com os verbos licet, oportet, necesse est:

a) Leuctrica pugna immortalis sit necesse est = é necessário que a batalha de Léutrica seja imortal.

b) Me ipsum ames oportet = convém que gostes de mim.


2. Com os imperativos cave, fac e sine:

a) Fac cogites in quanta calamitate sis = pensa na grande desgraça que te aconteceu.


3. Com verbos que expressam um ato da vontade, como nolo, volo, malo, etc., especialmente com as formas nolim, velim, malim e nollem, vellem, mallem, etc.

a) Huic imperat quas possit, adeat civitates = ordena-lhe que visite as cidades que puder.

b) Hunc admonet iter caute faciat = aconselha-o a que avance com cautela.

c) Quam mallem vinctos mihi traderet = quanto preferia que entregasse-me presos.


Paulo Barbosa



ACUSATIVO ADVERBIAL

ACUSATIVO ADVERBIAL é aquele que aparece junto a alguns verbos para determinar-lhe a extensão ou a intensidade da ação. Geralmente é o acusativo neutro de um pronome ou adjetivo. Vejamos alguns exemplos:

ID studeo = aplico-me a isso.

Laboro NIHIL = não trabalho em nada.

ALIQUID usus ac disciplina sublevabant = a experiência e a disciplina ajudavam-nos um pouco.


São também acusativos adverbiais as seguintes expressões:

ID temporis = por este tempo.

ID aetatis = por essa época.

ID genus = essa espécie.

Exemplo: ID genus alia = outras coisas desta espécie.


Paulo Barbosa

BUCÓLICAS OU ÉCLOGAS DE VERGÍLIO: A I ÉCLOGA

AS BUCÓLICAS são dez poemas em hexámetros que levam à cena sobretudo pastores. É a obra-mor de Vergílio, onde canta os amores pastoris e celebra os campos. Outro nome para a obra é ÉCLOGAS, que significa 'extratos'. De maneira discreta, entremeia o poeta agradecimentos a seus protetores, sobretudo ao Imperador Augusto.

A I Écloga é um diálogo constituído de 83 versos entre Melibeu e Títiro.

Melibeu é um escravo que perdeu suas terras em benefício de alguns soldados veteranos do Imperador Augusto, após a vitória da guerra de Filipos sobre os republicanos. Sai de suas terras levando suas cabras e no caminho encontra-se com Títiro descansando. Trava com este um diálogo, onde lastima as discórdias civis de então, os camponeses expropriados de suas terras em prol dos soldados do Imperador, a paisagem que não mais voltará a contemplar. Cai a tarde, e Títiro o convida a passar a noite com ele.

Títiro, por outro lado, é um escravo recém-liberto, que conservou seus campos, suas propriedades, e que, deitado debaixo de uma grande faia, atribui sua boa sorte a um deus, um jovem que tinha conhecido recentemente numa viagem que fizera à Roma e que para o qual sempre terá um cordeiro para sacrificar. Este deus benfeitor é o imperador Otávio, autor de sua tranquilidade e da paz em geral, a Pax Romana.

Vejamos as duas primeiras estrofes da I Bucólica:


MELIBOEVS

Tityre, tu patulae recumbans sub tegmine fagi

siluestrem tenui musam meditaris auena;

nos patriae fines et dulcia linquimus arua;

nos patriam fugimus; tu, Tityre, lentus in umbra,

formosam resonare doces Amaryllida siluas.


MELIBEU

Títiro, tu reclinado à sombra de uma vasta faia,

aplicas-te à musa silvestre com uma leve flauta;

nós deixamos os solos da pátria e os doces campos;

nós fugimos da pátria; tu, Títiro, vagaroso na sombra,

ensinas as selvas ecoar o nome da bela Amarílis.



TITYRUS

O Meliboee, deus nobis haec otia fecit:

namque erit ille mihi semper deus; illius aram

saepe tener nostris ab ouilibus imbuet agnus.

Ille meas errare boues, ut cernis, et ipsum

ludere quae uellem calamo permisit agresti.


TÍTIRO

Ó Melibeu, um deus proporcionou-nos este lazer:

pois, para mim ele sempre será um deus; em seu altar

frequentemente um tenro cordeiro de nosso aprisco sangrará.

Ele permitiu, como vês, que as minhas vacas errem e aquilo

que eu bem queira toque em meu agreste cálamo.


Paulo Barbosa

segunda-feira, 21 de maio de 2012

UM POUCO SOBRE HISTÓRIA DAS CONJUGAÇÕES LATINAS

O gramático Varrão (116-27 a.C.), baseado na vogal da 2ª pessoa do singular do presente do indicativo (amas, deles, [legis], audis), dividia os verbos latinos em três conjugações ou grupos classificados pela vogal temática. Além dele, Cominiano, Probo, Donato, Diomedes e Isidoro professavam a existência de apenas três conjugações, compreendendo na 3ª verbos em ere e ire.

Foi o gramático Sacerdos, do III século depois de Cristo, quem, pela primeira vez, ensinou a existência de 4 conjugações em latim. Nos séculos IV e VI, respectivamente, os gramáticos Carísio e Prisciano, adotaram de modo decisivo a divisão dos verbos em 4 conjugações, classificação essa que ainda hoje é adotada.

A divisão dos verbos em puros e contratos foi dada pelos gramáticos Cledônio e Eutíquio, do final do século IV d.C.

Paulo Barbosa


ASSONÂNCIA OU HOMOTELEUTO

A ASSONÂNCIA ou HOMOTELEUTO é o ornato de estilo que consiste na consonância ou harmonia das terminações. É, conforme Cícero, 'exornationem quae constat similiter desinentibus verbis, ornato que consta de vocábulos semelhantemente terminados" (Rhetorica ad Herennium, IV,3,5).

Era a assonância muito frequente em latim, onde as homofonias ocorriam a cada passo visto existirem em grande número vocábulos terminados em am, em, um, a, is, us, arum, orum.

Muitas vezes a assonância se verifica de modo simétrico, no fim de membros de frase, assimilando-se nesses casos à rima dos versos das línguas modernas.

Vejamos alguns espécimens de assonância ou homoteleuto:


"... earum rerum omnium" (Cícero, Pro Archia, I,I) = "... de todas estas coisas".

"... ea nescio quomodo quasi pleniore ore laudamus" (Cícero, De Officiis, I,18) = "... não sei de que modo louvamos tais ações senão com a boca mais cheia".

"... Iuvenes, fortissima frustra pectora..." (Vergílio, Eneida, II,48-49) = "... Ó jovens, corações inutilmente corajosos..."

"... adytis arisque relictis" (Vergílio, Eneida, II,351) = "... abandonados os santuários e os altares".

"O fortunatam natam me consule Romam!" (Cícero, De consulatu meo) = "Ó feliz Roma nascida sob meu consulado".

Paulo Barbosa

CATÃO, O PIONEIRO DA PROSA LATINA

MARCUS PORCIUS CATO, nascido em 234 a.C. numa família plebéia, em Túsculo, foi o mais ardoroso representante da tendência nacionalista romana. Era grosseiro, austero, muito honesto, conservador ao extremo, inimigo acérrimo de tudo o que não fosse latino. Catão é o verdadeiro protótipo do velho romano. Nunca teve em política a perspicácia dos adversários, porém, em eloquência, patriotismo e energia ninguém o superou. Embora desse pouca importância às letras, foi, no entanto, um autor fecundo e mesmo o pioneiro da prosa latina. Rendeu à família o mais desvelado dos cultos, sendo assim fiel aos costumes dos antepassados. Dizia: "Mais vale ser um bom marido que um brilhante senador".

Aos 17 anos foi soldado, passando rápido e sucessivamente pelos postos de questor, edil, pretor, cônsul e censor. Em 174 foi enviado a Cartago como deputado e, impressionado com o progresso crescente que lá observou, voltou a Roma apregoando a cada instante e em toda parte: "Censeo Carthaginem esse delendam, Julgo que Cartago deve ser destruída". Extraordinário orador, que conforme sua própria definição devia ser 'vir bonus dicendi peritus', não admitia a oratória vazia, sem sentido, pensando que as palavras surgem fluentemente a quem conhece o assunto - "Rem tene, verba sequentur". Segundo se conta, Catão, aos 80 anos, se converteu ao helenismo, estudando com paixão os discursos de Tucídides e Demócrito.

Catão escreveu muito: além de mais de 150 discursos, estudados e comentados na época de Cícero, foi autor de Origines, em 7 livros, onde se descreve a História de Roma até 149; De Agricultura ou De Re Rustica, único de seus livros que nos chegou inteiro; Carmen de moribus, espécie de enciclopédia prática em versos, conjunto de sentenças morais e cartas dos antigos; Praecepta ad filium, reunião de conselhos sobre eloquência, direito, medicina, agricultura e guerra.

Catão morreu em 149.

Vejamos quais as obrigações que tem o pai de família, segundo Catão, no seu De Agricultura:


"Pater familias ubi ad villam venit, ubi Larem familiarem salutavit, fundum eodem die, si potest, circumeat: si non eo die, at postridie. Ubi cognovit quomodo fundus cultus siet, operaque quae facta infectaque sient, postridie, eius diei villicum vocet, roget quid operis siet fractum quid restet satisne tempori opera sient confecta possitne quae reliqua sient conficere et quid factum vini, frumenti, aliarumque rerum omnium".

"O pai de família, assim que chega à herdade e reverencia o deus Lar, deve, se possível, percorrê-la em volta: se não for possível no mesmo dia, pelo menos no dia seguinte. Assim que tomou conhecimento de como o terreno é cultivado, que obras têm sido feitas ou não, deve mandar chamar o caseiro a seguir, perguntar-lhe o que já se fez e o que há ainda por fazer, se as obras foram feitas a tempo e se é possíve terminar as que restam e quanto se fez de vinho, trigo e todos os outros produtos".

Paulo Barbosa

ALITERAÇÃO, UM FENÔMENO ESTILÍSTICO

ALITERAÇÃO é a repetição do mesmo fonema no início de vários vocábulos contíguos ou bastante próximos, como, por exemplo: O rato que rói a roupa do rei de Roma deve morrer.

Em latim, encontramos vários casos desta repetição estilística:


"Iamque nocens ferrum, ferroque nocentius aurum prodierat" (Ovídio, Met., I,141-142)

"E já surgira o nocivo ferro e o ouro mais nocivo do que o ferro".


A aliteração pode ser involuntária, ou seja, não buscada pelo autor. Cícero, por exemplo, que combateu este choque de fonemas, não conseguiu em alguns casos evitá-lo. Assim, dando conselhos a seu filho Marcos, escreveu:

"Quae quattuor quanquam inter se colligata atque implicata sunt" (De Officiis, I,5)

"Embora estas quatro (fontes) se achem unidas e interdependentes".


No epílogo das Tusculanas, empregou novamente Cícero a aliteração:

"... tum incideret in mortis malum sempiternum: portum, potius paratum nobis et perfugium putemus, quo utinam velis passis pervehi liceat!" (I,49)

"... então caísse no castigo eterno da morte; é melhor pensarmos que está preparado para nós um porto e um refúgio, para onde oxalá nos seja permitido entrar com as velas abertas".

A aliteração em latim, conforme nos diz Vendryes em seu Essai sur l'histoire et les effets de l'intensité initiale, é de suma importância, por ser uma língua que, mais que qualquer outra, atribuía saliente importância à sílaba inicial.

Nos versos saturninos é muito encontrada, sobretudo quando servem para expressar sentimentos solenes de religiosidade. Entretanto, a influência do helenismo em Roma a partir de Ênio (século III a.C.), impediu que se tornasse dominante na poesia latina, mas, com certeza, pode-se afirmar que, contrariamente ao que se verifica com o grego, que pouca importância deu a este fenômeno estilístico, entre os poetas latinos, desempenhou papel essencial até a época de Augusto. A poesia alemã da Idade Média, escrita em alto alemão, é riquíssima em versos aliterantes.

É, enfim, a aliteração, artifício mais poético que prosaico, que, além de ser usada pelos retóricos, aparece, de preferência, nos provérbios, invocações e respostas dos oráculos.

Vejamos mais alguns exemplos:

"Manus manum lavat" (Provérbio) = "Uma mão lava a outra".

"Fortes fortuna adiuvat" (Provérbio) = "A sorte auxilia os fortes".

"Immortales mortales si foret fas flere" (Epitáfio de Névio) = "Se fosse lícito que os imortais chorassem os mortais".

"Veni, vidi, vici" (Resposta de Júlio César ao Senado Romano) = "Cheguei, vi, venci".


"Et, modo qua graciles gramen carpsere capellae" (Ovídio, Met., I,299) = "E, por onde há pouco as cabrinhas pastavam".

"Apellare virum virgo" (Ovídio, Met., IV,681) = "(E Andrômaca) virgem, (não ousa) dirigir a palavra a um homem".


"At tuba terribilem sonitum procul aero increpuit..." (Vergílio, Eneida, IX,503-504) = "Mas a trombeta com seu canoro bronze emitiu ao longo um formidável som".


"Ceterum censeo Carthaginem esse delendam" (Frase de Catão) = "De resto, julgo que Cartago deve ser destruída".


"Pallida mors aequo pulsat pede pauperum tabernas..." (Horácio, Odes, I,4,13) = "A pálida morte bate com pé igual as choupanas dos pobres".

"Vi victa vis" (Cícero, Pro Milone, XI,30) = "A força foi vencida pela força".


Paulo Barbosa.

domingo, 20 de maio de 2012

VERGILIUS OU VIRGILIUS?

VERGILIUS e não Virgilius, segundo Teuffel em sua Histoire de la Littérature Romaine, II, pág., 23, é o nome que se encontra nas inscrições do tempo da República e dos primeiros séculos da era cristã. O mesmo ocorre nos mais antigos manuscritos, como o Mediceus. Os gregos também, quase que exclusivamente, escrevem Bergílios ou Ouergílios. O primeiro exemplo de Virgilius de data certa é do século V da era cristã, e a partir mais ou menos do século IX para cá, em plena Idade Média, portanto, começou a adotar-se a ortografia Virgilius, baseada principalmente em etimologias imaginárias, como Virgo ou Virga, palavras que se grafavam antigamente Vergo e Verga. Nos séculos XIV e XV, novamente, vemos o triunfo do Virgílio sobre Vergílio. Foi Ângelo Policiano, erudito humanista italiano, quem provou ser a ortografia Virgilius incorreta. Entretanto, esta - Virgilius - foi defendida por G. Schultz em sua obra Ortographicarum quaestionum decas, Paderborn, 1855. Outros grandes filólogos, porém, defendem a grafia com e, como Hubner, Hagen, Creizenach, Ritschl.

Paulo Barbosa

sábado, 19 de maio de 2012

O HIATO

O HIATO é uma pequena pausa na pronúncia entre duas vogais sucessivas resultando num desagradável efeito acústico. Ou melhor, o hiato - que Cícero denomina hiulcae voces, palavras abertas, fendidas -, se verifica quando existindo duas vogais vizinhas a passagem da voz da primeira para a segunda é interrompida por um movimento brusco. Este fenômeno é bem frequente em latim, até mesmo mais que em grego, e é tido como um vício que atenta contra a harmonia do estilo. Porém, mesmo assim classificado, nem sempre foi condenado pelos gramáticos, escritores e retóricos de Roma. O recurso usado para evitar o hiato era a elisão, ou seja, a supressão ou queda de uma das vogais, geralmente a átona final.

Cícero e Quintiliano chegaram mesmo, em alguns casos, a alinhavar argumentos bastante plausíveis a favor do encontro de vogais sem elisão, ou seja, a favor do hiato, como por exemplo: quando se tiver a intenção de frisar o que se segue, ou o tempo em que um ator concede a outro ou a si mesmo no desenrolar de um drama, ou a hesitação de quem fala, ou mesmo o aproveitamento integral do som vocálico nas onomatopéias, etc.

Vejamos alguns exemplos de hiatos nos autores latinos:

"Ter sunt conati imponere Pelio Ossam" (Vergílio, Georg., I,281)

"Tres vezes (os gigantes) tentaram colocar o (monte) Ossa sobre o Pélio".


"Et vera incessu patuit Dea. Ille ubi matrem agnovit" (Vergílio, Eneida, I,405)

"E revelou-se deusa verdadeira pelo andar. Ele (Enéias) assim que reconheceu a mãe".



"Lamentis gemitumque et femineo ululatu tecta fremunt" (Vergílio, Eneida, 667-668)

"Tremem os tetos com os lamentos, com os gemidos e com o ulular das mulheres".



"Si me amas, inquit, paulum hic ades" (Horácio, Sátiras, I,38)
"Se me amas, disse, permanece aqui um pouco".



Vejamos mais exemplos:


PLAUTO:

"Me oportet" (Cativos, 955);

"Vi extrudam" (Soldado Fanfarrão);

"Te honeste" (Trinumo);

"Pondo amoris" (Truculento).


HORÁCIO:

"Esquilinae alites" (Epodo, V,100);

"Threici o Aquilone" (Epodo, XIII,3);


VERGÍLIO:

"Neptuno Aegaeo" (Eneida, III,74);

"Pereo hominum" (Eneida, III,606);

"Pecori et" (Bucólicas, III,6);

"Lauri et" (Bucólicas, III,63);

"Rhodope aut" (Bucólicas, VIII,44);

"Qui amant" (Bucólicas, VIII,108).


Paulo Barbosa

PRUDÊNCIO E PAULINO DE NOLA: DOIS POETAS DO SÉCULO IV

AURÉLIO PRUDÊNCIO CLEMENTE (348-410), foi o maior poeta cristão do século IV e um dos melhores representantes da poesia latina. Nasceu na Espanha, estudou advocacia e desempenhou alto cargo estatal quando, repentinamente, abandonou tudo para se consagrar à prática e defesa do cristianismo.

Prudêncio deixou cerca de 20.000 versos, nos quais procura seguir, de perto, as regras da canônica clássica.

Escreveu o Liber Cathemerinon, que são cantos para todas as horas do dia, e o Peristhephanon, que diz respeito às coroas dos mártires e dos santos.



SÃO PAULINO DE NOLA (353-431), que tinha o nome civil PÔNCIO MERÓPIO PAULINO, nasceu em Bordeus, então cidade da Gália Romana. Sua família era rica e nobre. Foi amigo e aluno de Ausônio, mas de repente surpreendeu o mestre ao abandonar tudo para ir viver pobre e penitente junto ao sepulcro de São Félix, em Nola, na Campânia.

Em 409, Paulino é nomeado bispo de Nola, e aí faleceu em 431.

Deixou Cartas, na maioria dirigidas a Ausônio; Natalicia, coleção de 14 poemas em louvor a São Felix; Epitâmios e Paráfrases, explicações de alguns salmos.

Paulo Barbosa

GRUPOS DE PALAVRAS: COORDENANTES E SUBORDINANTES

No seio de uma frase ou oração as palavras podem unir-se uma às outras constituindo, assim, núcelos bem distintos, denominados GRUPOS DE PALAVRAS.

Os vocábulos de um mesmo grupo de palavras pode estar simplesmente justapostos ou subordinados, sendo, no primeiro caso, grupo coordenante ou adicional, e no segundo, grupo subordinante.

A palavra, assim que se junta a outra ou a outras, passando a fazer parte do grupo, fica isenta às leis da linguagem, pois perde algo de sua individualidade em prol do novo todo em que se integra. Esta reunião de vocábulos, ou seja, o grupo de palavras, apresenta-se como um todo compacto, de difícil desagregação e resistente de maneira tenaz às inovações sobrevindas à língua.

Tais grupos de palavras, que nada são mais que verdadeiras expressões petrificadas muito de acordo com a tendência conservadora do povo romano, são frequentes nas expressões da língua religiosa, nas formas estereotipadas dos ditos, das sentenças, das máximas e dos provérbios, nas fórmulas de juramentos e maldições, na linguagem juridica, assim como nas formas da linguagem expressiva.

Vejamos alguns exemplos dos dois tipos:

1. GRUPOS DE PALAVRAS JUSTAPOSTAS OU COORDENANTES (ADICIONAIS)


Domi militiaeque = na paz e na guerra

Filiis filiabusque = aos filhos e às filhas

Ferro ignique = a ferro e fogo

Terra marique = na terra e no mar


2. GRUPOS SUBORDINANTES


Sponte sua = por sua própria vontade

Certiorem facere = informar

Ducere uxorem = casar-se

Dare operam = esforçar-se, exercitar-se

Agere gratias = agradecer

Iter facere = marchar

Aequo animo = de boa mente


Paulo Barbosa

INFINITIVO PASSIVO ARCAICO: CURIOSIDADE

O INFINITIVO PASSIVO ARCAICO em -IER, como 'nitier', 'citarier', 'compararier', encontrados, por exemplo, em Catulo, foi empregado, segundo o estudioso Lange, 187 vezes por Plauto, 46 por Lucrécio e 6 por Vergílio. Depois da época de Silas (138-78 a.C.), este infinitivo despareceu da língua falada, apenas sendo usado como arcaísmo por alguns autores para dar maior solenidade à obra.

As formas clássicas correspondentes de tais infinitivos são: 'niti', 'citari', 'comparari'.

Paulo Barbosa

quinta-feira, 17 de maio de 2012

'CUM' HISTORICUM

CUM HISTORICUM é aquele que pede o verbo no imperfeito ou mais-que-perfeito do subjuntivo para relatar os acontecimentos concomitantes do fato principal:

CUM Puteolos venissem... (Cic., P. Planc., 27,65) = Chegando eu a Putéolos...

Cecidit Critias CUM quidem fortissime pugnaret (Nep., Thras., 2,7) = Caiu Crítias QUANDO, na verdade, estava combatendo com valor.

Paulo Barbosa

sexta-feira, 11 de maio de 2012

DIFERENÇA ENTRE 'QUIS' E 'QUI'

QUIS e QUI são dois pronomes interrogativos latinos, mas com a seguinte diferença:

QUIS interroga sobre a identidade da pessoa ou coisa, traduzido por: quem? qual? que pessoa? que coisa?

QUIS VENIT?  = QUEM VEIO? (qual pessoa veio? qual seu nome?)


Veja que quis geralmente é pronome substantivo, ou seja, figura no lugar do nome.


QUI interroga sobre a qualidade, a propriedade da pessoa ou coisa e se traduz por: que espécie? que qualidade?

QUI DISCIPULUS EST? = QUE ESPÉCIE DE ALUNO É ESSE?

QUI VIR EST? = QUE QUALIDADE DE HOMEM É?

Qui geralmente é pronome adjetivo, ou seja, sempre vem ligado a um nome (discipulus, vir).

Paulo Barbosa

PASSIVA IMPESSOAL

Em português, somente os verbos transitivos podem ter voz passiva, como, por exemplo, amo e sou amado. Verbos intransitivos não podem sofrer esta transformação: morrer, no sentido de 'deixar de viver, perder a vida', por exemplo, não tem voz passiva.

Em latim, porém, podem aparecer na voz passiva verbos intransitivos ou verbos transitivos empregados sem complemento ou objeto. É o que se denomina passiva impessoal:

Ire, ir, verbo intransitivo no sentido de 'passar de um lugar para outro', pode aparecer na passiva impessoal: ITUR = VAI-SE. Assim:

SIC ITUR AD ASTRA = ASSIM SE VAI ÀS ESTRELAS, é a famosa expressão de Vergílio (Eneida, 9,641), aludindo à subida típica do herói ao céu, em especial de Hércules. Mais tarde, Sêneca retoma a frase (Ep. 48,11; 73,15), para indicar o árduo caminho da filosofia, mas caminho este que leva à consecução de grandes resultados. Outra vez mais, Prudêncio, autor cristão, em seu Cathemerinon (10,92), retoma a expressão reformulando-a, porém, com cunho cristão evidente: AD ASTRA DOLORIBUS ITUR = VAI-SE ÀS ESTRELAS ATRAVÉS DAS DORES.


Pugnare, combater, lutar, verbo neste sentido usado sem objeto, mas que se pode colocar na passiva:

PUGNATUM EST = LUTOU-SE.


Amare, amar, verbo transitivo que pode ir para a passiva impessoal, aquela que não indica a pessoa que executa a ação:

AMATUR = AMA-SE.

Paulo Barbosa

NOMINATIVO COM INFINITIVO

Muitos verbos que regem oração infinitiva ou acusativo mais infinitivo, quando estão na passiva, constroem-se pessoalmente, ou seja, o sujeito do infinitivo (que está em acusativo) passa a sujeito do verbo passivo. Assim:

DICITUR GALLOS IN ITALIAM TRANSISSE = DIZ-SE QUE OS GAULESES PASSARAM À ITÁLIA

sendo vertido para a passiva, assim fica:

GALLI DICUNTUR IN ITALIAM TRANSISSE

Gallos, acusativo sujeito do infinitivo transisse, passou, na passiva, a sujeito - galli - do verbo passivo - dicuntur.

Paulo Barbosa

GENITIVO QUANTITATIVO

GENITIVO QUANTITATIVO é aquele que determina adjetivos, pronomes e advérbios indicando quantidade ou aspecto mensurável, comparável.

TANTUM CIBI ET POTIONIS = TANTA COMIDA E BEBIDA (literalmente: tanto de comida e de bebida).

NIHIL NOVI = NADA DE NOVO.

PLURIMUM AUDACIAE = O CÚMULO DA AUDÁCIA.

SATIS ELOQUENTIAE = BASTANTE ELOQUÊNCIA (literalmente: bastante de eloquência).

EO VECORDIAE PROCESSIT = CHEGOU A TAL PONTO DE LOUCURA.

Paulo Barbosa

CUJAS, ATIS = DE QUE LUGAR?

SOCRATES CUM ROGARETUR CUJATEM SE ESSE DICERET: MUNDANUM, INQUIT = PERGUNTANDO-SE A SÓCRATES DE QUE PÁTRIA SE DIZIA NATURAL, RESPONDEU: DO MUNDO (Plauto).

O pronome CUJAS, ATIS quer dizer: DE QUE PÁTRIA, DE QUE PAÍS, DE QUE RELIGIÃO, DONDE. Assim, mais dois exemplos:

CUJATES ESTIS? = DONDE SOIS? (Plauto).

CUJATIS ESSE? = DE QUE TERRA ERA ELE? (Átio, poeta trágico romano).

Paulo Barbosa

quinta-feira, 10 de maio de 2012

IDIOTISMO

IDIOTISMO é o fato gramatical peculiar a uma língua e que por isso não pode passar ou ser traduzido para outro idioma. Neste caso, é necessário, no idioma a que se traduz, empregar circunlóquio que expresse com a maior fidelidade possível o pensamento da língua vertida. Entretanto, nesta tentativa não se deve ater à disposição material das palavras.

Vejamos alguns exemplos:

ADQUIRIR FAMA, em latim pode ser CAPERE SIBI NOMEN, que, literalmente, é 'tomar nome para si'.

ALISTAR-SE COMO SOLDADO = DARE NOMEN MILITAE, ('dar o nome à corporação militar').

ESTAR NA FLOR DA IDADE = AETATE FLORERE, ('florescer na idade').

FALTAR À PALAVRA = VIOLARE FIDEM, ('violar a fidelidade, a lealdade').

FAZ MUITO FRIO = SAEVIT FRIGUS, ('o frio está furioso').

FAZER A CAMA = STERNERE LECTUM, ('estender a cama').

FAZER RIR = MOVERE RISUM, ('mover o riso').

PERDER O TEMPO = LATEREM LAVARE, ('lavar tijolo').

VALHA-ME DEUS! = PROH DEUS!, ('oh Deus!').

O melhor meio de enquadrar os idiotismos de uma língua vertida ao latim é a leitura criteriosa e constante dos clássicos, assim como o manejo de bons dicionários.

Paulo Barbosa


LUMEN, LUX, JUBAR

LUZ, em latim, dentre tantos vocábulos para designá-la, podemos citar LUMEN, LUX e JUBAR, porém, com as seguintes distinções:

LUMEN designa a luz ou radiação luminosa como inerente, agregada ao corpo luminoso que a emite.

LUX designa a luz como independente do corpo que a despede ou emite, como se fosse uma substância autossuficiente, subsistente independente do corpo luminoso. Por outra, lux é a claridade produzida pelo corpo luminoso, mas considerada em abstrato e independente deste corpo que a emite.

Para exemplificar, o sol, quando desponta no horizonte, apresenta à vista dos homens a sua LUX: lux solis. Quando, porém, os olhos fitam diretamente o corpo celeste, o que se vê é o LUMEN: lumen solis.

Lumen Christi, nome de uma livraria católica do Mosteiro Beneditino do Rio, significa exatamente: Radiação luminosa que vem de Cristo, Luz inerente a Cristo, Luz ou luminosidade que Cristo porta em si mesmo.

Lumen, por ser a radiação luminosa inerente ao corpo emitente, tem outros significados em latim, quando no plural - LUMINA -, podendo significar AS LUZES, OS OLHOS, AS JANELAS, A GLÓRIA, A HONRA, O ORNAMENTO, etc., todos referentes a esplendor, a brilho ou a passagens por onde entram.

Lux, por ser considerado nome da matéria, da substância luminosa, carece de plural.

JUBAR é palavra poética para significar a luz que um grande corpo celeste envia à terra, mas refere-se, principalmente, à luz do planeta Vênus. É por isso que significa Estrela vespertina ou d'alva, isto é, o planeta Vênus.

Paulo Barbosa