quinta-feira, 13 de setembro de 2012

PLURAL MAJESTÁTICO, UM POUCO DE SUA HISTÓRIA

A origem do NÓS MAJESTÁTICO é, realmente, um nó górdio para a História. Entretanto, uma grande maioria de estudiosos atribuem-no ao fato de o Império Romano ter sido dividido em dois, com um Imperador em Roma e outro em Constantinopla e ambos usarem o plural nos documentos por serem sócios no governo. Contra esta tese, porém, argumentam que autoridade dividida é autoridade diminuída e por isso não é provável que daí dimanasse o esplendor do plural para um só indivíduo. Nesta lide, Wackernagel em sua obra Vorlesungen uber Syntax, I, 100, informa que o plural de majestade aparece já em uma carta de Xerxes da Pérsia a Pausânias e era uso geral entre os Selêucidas.

Na antiga legislação portuguesa os monarcas usaram MANDAMOS em uns documentos e MANDO em outros. Em Dom Afonso, Dom João e Dom Manuel existem duas personalidades, assim como em Xerxes e Antíocos e nos Imperadores Romanos: a do príncipe e a do homem, forte ou abatido, na vida pública ou particular, mas homem como os outros. Ora, é possível que tais imperadores e reis lembrassem de expressar por meio do plural as duas personalidades associadas em suas mentes uma à outra e, impressionados com o excelente efeito que tenha isso causado, insistissem em servir-se do plural nos documentos públicos. Lançada a ideia e compreendido o seu valor prático, o plural começou a se tornar estilo de ostentação entre os Imperadores Romanos e depois em todas as cortes européias.

Outra hipótese aventada é que este NÓS dos monarcas começasse como leve alusão ao séquito, aos soldados que se ajuntaram à pessoa real, caso fosse preciso, para se fazer obedecer.

Acima da majestade real, como se pensava na Idade Média, está a majestade papal, da Igreja, e a inocente fórmula 'servus servorum Dei' (servo dos servos de Deus), usada pelo Papa, nunca embargou o emprego do nós. Assim, escrevia Leão X (1475-1521): "Pro parte dicti Emmanuelis Regis nobis fuit humiliter supplicatum".

Mais anteriormente ainda, nas cartas de Gregório VII (1020-1085) escritas geralmente na sua qualidade de autoridade suprema da Igreja, encontram-se a cada passo VOLUMUS, NOS, DIRIGIMUS, ACCEPIMUS, SCRIPSIMUS, INDICAVIMUS, PROHIBEMUS, e tantos outros verbos no plural.  Quando, porém, em algumas epístolas refere-se à sua pessoa como simples homem, usa, então, a 1ª pessoa no singular. Vejamos alguns exemplos:

"Quod autem mihi valde gemendum est, mors eius super me cecidit et omnia viscera mea concutiens penitus conturbavit... In me quasi vesani insurrexerunt. - Hoc scilicet mente mecum versans... testis mihi Deus sit... - In curia sua speciali honore me tractavit. - Quanta tribulatio me angustat... tribulationis cordis mei".

Outras vezes, por motivo todo subjetivo, vem o singular numa frase e o plural noutra:

"Multa quippe de te mihi relata sunt atque ex tuis actibus honesta fama ad aures nostras usque pervenit".

Quando Gregório escreve a um amigo íntimo, como o abade de Cluny, a quem conta seus desgostos longamente, só emprega, naturalmente, a 1ª pessoa no singular. 

Em geral, o papa fala por TU aos bispos, arcebispos, etc., como a irmão; aos reis, príncipes, duques, etc., como a filhos diletos. Já o VÓS é, do ponto de vista papal, uma honra especial, um quase título por meio do qual se distingue certos príncipes seculares.

Paulo Barbosa

Um comentário: