Numa abordagem moderna do pronome relativo 'quem', diferentemente do que a gramática tradicional prescrevia, nos deparamos hoje com o que se denomina 'orações relativas sem antecedente' ou 'orações relativas livres', onde alguns gramáticos renomados não aceitam a existência no citado pronome da presença de dois pronomes constitutivos, como já estudado em tópico anterior (aqui: http://topicosdelatinidade.blogspot.com.br/2018/02/oracao-adjetiva-introduzida-por-quem.html).
Outros afirmam, enfim, que o relativo 'quem', em certas orações, é pronome indefinido equivalendo a 'quem quer que', não sendo esse, porém, o seu sentido mais frequente. Quanto a essa questão abordaremos num próximo tópico.
"ORAÇÕES RELATIVAS SEM ANTECEDENTE EXPRESSO" OU "RELATIVAS LIVRES" COM 'QUEM' são orações, segundo gramáticos modernos e renomados, em que o tal relativo é empregado em sentido absoluto, não anafórico, não existindo, portanto, em sua estrutura um antecedente nominal realizado. Celso Cunha e Lindley Cintra, por exemplo, falam de pronomes relativos sem antecedente ou relativos indefinidos, e Evanildo Bechara de apagamento do antecedente. Vamos aos exemplos:
QUEM ama educa.
QUEM vai ao mar perde o lugar.
QUEM conhece João sabe que é bom rapaz.
QUEM tem amor tem calma.
QUEM espera sempre alcança.
QUEM vi ontem no restaurante passou por ti agora.
Analisando detidamente as orações acima, tais relativas livres não suportam em nenhum dos casos o denominado apagamento do antecedente, como ensina Bechara et alii., o que confirma a tradicional doutrina gramatical da separação do pronome em seus dois pronomes equivalentes. O que temos acima são orações em que o pronome 'quem' é subjetivo podendo ser desmembrado deste modo:
AQUELE QUE ama educa.
AQUELE QUE vai ao mar perde o lugar.
AQUELE QUE conhece João sabe que é bom rapaz.
AQUELE QUE tem amor tem calma.
AQUELE QUE espera sempre alcança.
AQUELE QUE vi ontem no restaurante passou por ti agora.
Outros exemplos:
Recebi QUEM tu recomendaste.
Mário procura QUEM o possa ajudar nos estudos.
O mestre viu QUEM fez o trabalho.
Foi ela QUEM fez o bolo.
O patrão elogiou QUEM cumpriu a meta.
Há sempre QUEM o ouça.
Nestes exemplos também em que falta um antecedente expresso é possível perceber a presença cumulada dum antecedente semântico de maneira que o 'quem' exerce em todas as orações supra dupla função, de objeto direto ou predicativo do verbo da principal e de sujeito do verbo da subordinada adjetiva:
Recebi AQUELE QUE tu recomendaste.
Mário procura AQUELE QUE o possa ajudar nos estudos.
O mestre viu AQUELE QUE fez o trabalho.
Foi ela AQUELA QUE fez o bolo.
O patrão elogiou AQUELE QUE cumpriu a meta.
Há sempre AQUELE QUE o ouça.
ESCLARECIMENTOS: O pronome 'quem' só pode ser anafórico, ou seja, somente pode ter antecedente, se for precedido de preposição, como, por exemplo: 'Esta é a pessoa de quem te falei'. Sendo precedido de preposição jamais poderá figurar como sujeito de uma relativa com antecedente implícito. Quando não precedido de preposição, 'quem' corresponde sempre a 'aquele que', 'a pessoa que', 'alguém que', como visto nos exemplos acima. O fato de figurar absoluto, entretanto, em início de oração ou após verbo, não significa inexistência de antecedente, pois este existe de modo implícito, semântico, não havendo a possibilidade de qualquer apagamento do termo antecedente. Que fique bem claro isso.
"RELATIVAS LIVRES" EM LATIM
QUI gladio ferit gladio perit = QUEM com a espada fere, com a espada perece.
QUI honorat se ipsum honorat = QUEM honra os outros honra a si mesmo.
QUI fuit rana nunc est rex = QUEM foi rã agora é rei.
QUI non proficit deficit = QUEM não avança fica para trás.
QUI timet Dominum nihil trepitabit = QUEM teme ao Senhor de nada terá medo.
QUI tacet non utique fatetur, sed tamen verum est eum non negare = QUEM cala realmente não confessa, mas também é verdade que não nega.
Nestas orações supra o relativo 'qui' latino possui um antecedente implícito do mesmo modo que o 'quem' português, a saber, o pronome 'ille / illa = aquele / aquela". Outros pronomes que podem também ser correlativos do 'qui' são: 'is, hic, iste', sendo que, muito frequentemente, tais antecedentes se elidem quando são do mesmo caso de 'qui' ou quando são facilmente subentendidos.
Diu vixit IS, QUI bene vixit = viveu longamente AQUELE QUE (= QUEM) viveu bem.
Ou, por ser o antecedente 'is' do mesmo caso do pronome relativo 'qui', pode ser omitido:
Diu vixit, QUI bene vixit.
Paulo Barbosa
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